quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Morre um fragmento da História viva do Holocausto

 

Alice Herz-Sommer inspirou documentário que concorre a Oscar. Filho e amor à música foram incentivos para resistir aos nazistas.

Alice Herz-Sommer, que acredita-se ser a mais velha sobrevivente do Holocausto, morreu aos 110 anos neste domingo (23), segundo um membro de sua família. A morte da talentosa pianista aconteceu apenas uma semana antes de sua extraordinária história de sobrevivência durante dois anos em um campo de concentração nazista através da devoção à música e ao filho  concorrer a um oscar. Herz-Sommer morreu em um hospital após ser internada na última sexta-feira, disse sua nora, Genevieve Sommer.
“Todos chegamos a acreditar que ela simplesmente nunca morreria”, disse Frederic Bohbot, produtor do documentário “The lady in number 6: Music saved my life”. “Nunca tive dúvidas de que ela iria assistir ao Oscar”. O filme, dirigido por Malcolm Clarke, é um dos indicados na categoria melhor documentário de curta-metragem na cerimônia que acontece no próximo dia 2.
Herz-Sommer, seu marido e seu filho foram enviados em 1943 de Praga a um campo de concentração na cidade tcheca de Terezin (Theresienstadt, em alemão), no qual os prisioneiros tinham permissão para apresentar espetáculos dos quais ela participava com frequência.
Cerca de 140 mil judeus foram enviados a Terezin e 33.430 morreram ali. Aproximadamente 88 mil foram transferidos para Auschwitz e outros campos, onde a maioria foi morta. Herz-Sommer e seu filho, Stephan, estavam entre os menos de 20 mil a serem libertados quando o famoso campo foi liberado pelo exército soviético em maio de 1945. 
Ainda assim, ela se lembrava de “sempre rir” durante sua passagem por Terezin, onde a alegria por continuar tocando a fazia seguir adiante. “As pessoas ficavam sentadas lá, idosos, desolados e doentes, e elas vinham a esses concertos e a aquela música era para eles nosso alimento. A música era realmente nosso alimento. Através da música nós fomos mantidos vivos”, disse ela certa ocasião.
Embora nunca tenha descoberto onde sua mãe morreu após ser aprisionada e seu marido ter morrido de tifo em Dachau, na velhice ela não expressava amargura. “Somos todos iguais. Bons e ruins”, dizia. Herz-Sommer nasceu em 26 de novembro de 1903, em Praga, e começou a aprender a tocar piano aos cinco anos, com sua irmã. Quando criança, conheceu o escritor Franz Kafka, amigo de seu cunhado, e adorava ouvir as histórias do autor.
Alice se casou com Leopold Sommer em 1931. O filho deles nasceu em 1937, dois anos antes da invasão nazista à Tchecoslováquia. “Essa foi uma época muito, muito difícil, especialmente para os judeus. Eu não me importo, porque adorava ser mãe e estava cheia de entusiasmo por causa disso, então não me importei tanto”, contou.Em 1949, ela deixou a Tchecoslováquia para se encontrar com sua irmã gêmea Mizzi em Jerusalém. Ela lecionou no Conservatório de Jerusalém até 1986, quando se mudou para Londres. Seu filho, que alterou o primeiro nome para Raphael após a guerra, fez carreira como violoncelista. Ele morreu em 2001.
Anita Lasker-Wallfish, uma amiga que também esteve no campo de concentração, disse que Herz-Sommer ainda estava animada durante uma visita na semana passada. “Ela era realmente otimista”, disse, acrescentando que a dupla costumava jogar palavras cruzadas em um jogo de tabuleiro frequentemente, até que as vistas de Herz-Sommer começaram a falhar. “Ela começou a se sentir muito desconfortável e foi para o hospital na última sexta. Acho que chegou ao limite”. A amiga revelou ainda que Herz-Sommer tinha uma vida modesta, e que provavelmente recusaria toda a atenção da imprensa direcionada à sua morte. “Ela não se achava alguém muito especial. Ela odiaria qualquer estardalhaço”, disse.

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